terça-feira, 24 de novembro de 2009

E se eu soubesse escrever ficção I

Ela aparece, virando a esquina da manhã, surgida do meio do nevoeiro. Dá-me dois beijos frios, frescos, despachados. "Então, como é que tens andado?" pergunta enquanto tira o casaco e se senta com gestos decididos.
Rodo a chávena do café, enquanto procuro uma resposta que não fosse mentira. "Tenho tanta coisa para te contar!" Digo, desviando-me para a frente. "Já comeste? Têm umas torradas fabulosas."
Não quero falar, não quero que ela saiba como os sonhos se esvairam, não lhe quero dizer que as promessas que fizemos escorregaram de mim.
"Então e tu, que tens feito?" Passo-lhe a bola. Mas sei que ma vai devolver num instante. Nunca perdeu a frontalidade nem a mania de fazer perguntas directas, a roçar a indelicadeza.
Olho-a nos olhos, verdes e frios e sei que não a trocava por nada. Deixo-me embalar pela narrativa dela e espero pela minha vez de desnudar a alma, sem medo, a saber que os sonhos estão guardados em nós e vão reaparecer mais vezes, nas manhãs de nevoeiro, quando for preciso refrescar o espírito.

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